Em Ruínas

quinta-feira, junho 16, 2005

"- A tua mãe também costumava deitar o perfume para o ar e passar por baixo?
- Sim.
- Ela é assim.
- Como o perfume?
- Quando estou longe dela, o cheiro fica entranhado na minha pele.
"

do filme Somersault


terça-feira, maio 31, 2005

revejo-me

"... direi que a loucura, certa loucura, anda muitas vezes de braço dado com a poesia. Assim como custaria muito às pessoas equilibradas serem poetas, talvez custe muito aos poetas serem equilibrados. No entanto, a razão ganha sempre a partida, base da justiça, que deve governar o mundo".

Pablo Neruda in Confesso Que Vivi

domingo, maio 15, 2005

sabes que tens nas palavras a força bruta de um punhal. sabes que te oiço sempre, que se sorris comigo o mundo brilha, que se choras comigo me alivias. sabes também que tanto tempo vivido intensamente conta. é por isso que sabes exactamente onde magoar.

ela precisa tanto de ti. tanto que és o cavaleiro andante que lhe defende a honra e os bons costumes. tanto que sabes que ela não tem força para suportar o mundo sem ti. nem o mundo nem apenas uma conversa, em que nem admite que errou.

não sou um poço de crueldade ou indiferença. achas que as coisas não me atingem? e fazem-no principalmente porque o tempo conta e as memórias vividas também.

mas, claro, não podias estar alheio. não podias ter uma opinião calada, ausente. ela não deixa. ou tu não queres. porque ela é tão fraca que precisa de alguém que empunhe a espada que ela não consegue carregar e que a espete com a violência de uma dor que não acaba.

obrigada por seres incondicional. até assim. a ponto de fechares os olhos e não veres para lá disso. estás cego. de amor? não creio. apenas cego, porque não queres ver.

quarta-feira, abril 27, 2005

00h17

eu sabia que me ouvias. foi por isso que te disse aquelas tolices, como se fossem inocentes. e, se ouvisses com mais atenção, percebias: estava tudo ali.
achei que se te imaginasse à minha frente, a olhares-me enquanto conversávamos, seria mais fácil escrever. foste a minha fonte de inspiração. não sei se resulta, não posso avaliar palavras. menos ainda as minhas.
mas posso avaliar-te a cada sonho que crias em mim, a cada sentido que despertas, a cada emoção contida e não revelada.
[foi por isso que te disse aquelas tolices, todas elas]

e julgo-te em cada pedaço do meu corpo que resta longe do teu, imaginando que tens uma dimensão real que consigo tocar. a cumplicidade nasceu bem antes disso. e a atracção também. as palavras têm esse poder. a esta hora, já noite e silêncio me envolvem, e ficaste ao meu lado. como um eco. tão suave, desliza pelo meu pescoço e entra no meu ouvido sem me incomodar. e permanece o tempo necessário. até amanhecer.
[nos sonhos é assim...]

sábado, abril 23, 2005

Dia do Livro

"Se tivesse de recomeçar a vida, recomeçava-a com os mesmos erros e paixões. Não me arrependo, nunca me arrependi. Perdia outras tantas horas diante do que é eterno, embebido ainda neste sonho puído. Não me habituo: não posso ver uma árvore sem espanto, e acabo desconhecendo a vida e titubeando como comecei a vida. Ignoro tudo, acho tudo esplêndido, até as coisas vulgares: extraio ternura duma pedra. Não sei - nem me importo - se creio na imortalidade da alma, mas do fundo do meu ser agradeço a Deus ter-me deixado assistir um momento a este espectáculo desabalado da vida".

Raul Brandão in Se tivesse de recomeçar a vida

quinta-feira, abril 14, 2005

"Voltou-se para mim, olhou-me bem nos olhos; deixou-me o seu poema. Todos os vapores se escoam através da chaminé do meu ser. Guardarei até à morte a confiança por ti demonstrada. Semelhante a uma onda de grandes dimensões, semelhante a uma coluna de águas pesadas, ele passou-me por cima (ou pelo menos a sua presença devastadora) e deixou a descoberto todos os seixos existentes na praia que é a minha alma".

Virginia Woolf in As Ondas

quinta-feira, abril 07, 2005

o meu jardim

ainda nem fiz a mala e os sonhos já lá estão todos, arrumados num cantinho. é por isso que não me posso apaixonar.
não me fales assim ao ouvido, os sussurros são traiçoeiros. nem me olhes dessa forma, não me impeças de agarrar um sonho.
sabes que não é justo o que estás a pedir. não seria também se te dissesse vem comigo. acima de tudo porque estás sempre aqui, em cada pedaço de pele, em cada cabelo desalinhado, em cada palavra sentida ou em cada sorriso perdido em recordações.
não é boa a saudade? e o reencontro, tão doce e intenso? não podemos sufocar o que está aqui entre nós. se queremos edificar o sol, temos que deixá-lo brilhar. se queremos olhar as estrelas, deixemos que elas se alinhem. e se queremos ouvir a lua, façamos silêncio e olhemos o céu.
eu vou lá estar. e tu comigo, sempre.